Por meio de suas longas observações, Montessori percebeu que a criança passava por diversos períodos sensíveis. De zero a seis anos, a criança está numa fase de intensa absorção de seu ambiente e ao mesmo tempo se trata de um período durante o qual os sentidos estão à flor da pele, buscando serem educados. Os materiais Montessori para primeira infância trabalham justamente com a ideia de educação sensorial, assim, há séries de materiais que educam os olhos para a discriminação minuciosa de cores e tons, para a identificação de formas geométricas mais e menos semelhantes, para texturas, pesos e tamanhos com gradações de variação, do óbvio ao quase imperceptível.
Crianças de cinco anos já são capazes, por treino voluntário, de identificar notas musicais, formas geométricas as mais variadas, sessenta e quatro tons e cores e são capazes de perceber acuradamente diferenças de tamanho, peso ou textura. Este seria, para Montessori, o início do treino dos sentidos necessário à apreciação artística. Os olhos estariam educados para notar a utilização de cores e formas, os ouvidos para perceber a melodia, as mãos para sentir e para criar, já que há razoável abundância de materiais que treinam o controle motor dos braços, mãos e dedos.
Estar “educado” aos cinco anos não quer dizer, no entanto, que não se possa tirar prazer da arte antes disso. Nas salas de aula Montessori, e na sua casa pode ser assim também, sempre há uma música tocando. Quase invariavelmente se trata de música clássica, pelo tipo de melodia que não atrapalha a concentração e auxilia a percepção musical da criança. As paredes são decoradas com quadros renomados, para que desde a primeira infância possa-se ter contato com as obras de arte fundamentais da civilização.
A mobília dos ambientes deve ser muito limpa e muito bem organizada, para que haja menos confusão de estímulos e aquilo que for relevante para os sentidos possa ser absorvido. As cores do ambiente devem ser suaves, embora os quadros possam trazer cores mais fortes. Alguns argumentam que a música poderia atrapalhar a concentração. Estudiosos do tema, no entanto, dizem que pequenos ruídos não só não atrapalham a concentração, como podem auxiliar seu desenvolvimento.
O quarto de seu filho pode ter belos quadros na parede, e você pode perguntar a ele o que ele vê na gravura, e ao mesmo tempo contar o que se passa na ilustração. Dê os nomes dos quadros e dos pintores, crianças pequenas adoram categorizar coisas mentalmente, e pode ser um atrativo a mais apreender os quadros por pintores ou por seus nomes.
Se seu filho já aprendeu as cores, você pode perguntar que cores existem no quadro, e permitir que ele aponte onde está cada cor, mas nunca force sua atenção, faça tudo de forma que seu filho seja livre para demonstrar que não quer mais a qualquer momento. A arte deve ser algo agradavelmente absorvido e aprendido, e não uma sequência de lições forçadas que o façam saber todas as datas e os nomes, mas o façam desistir de visitar museus para sempre, sob a alegação de monotonia.
A produção artística é objeto de intenso debate entre estudiosos montessorianos. Alguns argumentam que o desenho deve ser guiado por exercícios para as mãos, outros dizem que enquanto há exercícios, deve haver também oportunidade para o desenho livre. Maria Montessori sempre foi adepta da espontaneidade infantil, de forma que considerava o desenho livre algo fundamental à sala de crianças pequenas.
Ela percebeu, no entanto, que havia uma melhor desenvolvimento da habilidade manual da criança, e até uma preferência por parte dos pequenos, se inicialmente se permitisse o desenho livre por algum tempo, até serem inseridos os primeiros exercícios de desenho, baseados no contorno de formas geométricas em metal. Em seguida, se ensinaria a traçar linhas retas e a respeitar as bordas, para depois se ensinar a utilização de um mesmo lápis colorido para a produção de diferentes tons de cor e finalmente, depois de a mão se ver educada, se retornaria ao desenho, desta vez baseado em observação, um desenho que partisse da realidade.
Montessori enfatizou também a importância da música e disse que não só deveria haver a possibilidade de todas as crianças aprenderem um instrumento depois de serem educadas para a percepção e leitura musicais, mas que também todos os professores da primeira infância deveriam saber tocar pelo menos um instrumento, para que as crianças pudessem reconhecer as notas para além do som produzido pelo material musical básico, que é composto por sinos de metal que produzem uma escala completa.
Como sempre, se a criança demonstrar vontade de se desenvolver mais nas áreas ligadas à arte, esta liberdade lhe deve ser dada, e se deve perceber por observação o que é que ela busca, e auxiliá-la por meio de materiais e instrução. Caso seu filho demonstre que gosta de pinturas, procure mostrar a ele livros de mestres da pintura com diversas gravuras, e ensine um ou outro nome mais importante. Dê-lhe pequenas biografias de pintores para ler, para que se inspire, e se o interesse chegar a este ponto, procure um professor de desenho para crianças, que seja ao mesmo tempo libertário e rígido, para que seu filho possa seguir seus interesses e tendências pessoais, mas para que sua mente se sinte desafiada, e não somente propensa a criar rabiscos durante algumas horas todas as semanas.
O mesmo se dá quanto a instrumentos musicais. Se seu filho demonstra gosto por música, e você percebe bem estar, contentamento ou interesse durante uma boa peça, pergunte a ele se gostaria de aprender a tocar, e ensine-o, ou encontre alguém que possa ensiná-lo. Novamente, pense em um professor que enxergue sua criança como um ser humano, e que o respeite, de forma a permitir a ele a liberdade necessária e exigir dele o esforço que torna tudo mais interessante.
Lembre-se, porém, que seu filho somente passará a cultivar o gosto pela alta arte a partir do momento em que tiver alguém em quem se espelhar. Ele passará muito tempo diante de um quadro se vir que há o que descobrir nele, e só verá isso se seus pais examinarem as obras com atenção e interesse verdadeiros. O mesmo se dará com a música. Pais que escutem música e conversem sobre tendem a cultivar o gosto e a educação musical nos filhos. Idas a museus não devem parecer nunca uma tarefa a cumprir, mas algo tão divertido quanto ir a um cinema ou um parque. Sendo a Literatura uma forma de arte, aproveito para ressaltar que o amor pela leitura tem a mesma fonte: não adianta ler para seu filho. Ele tem de ver que você lê para você também, por prazer e interesse, para que haja sentido ele o fazer sozinho, e não só em dupla com os pais e professores.
Guarde sempre nossos princípios maiores: expor a criança ao estímulo necessário, falar somente o estritamente relevante, e observar sua reação ao objeto, à imagem ou ao som. A partir da reação do seu filho é que você dará o próximo passo, e não por meio de um plano pré-estabelecido de educação artística. A percepção da arte deve partir de dentro dele, e não ser imposta de fora, pois se brotar da própria criança, durará por toda a vida, e será uma inesgotável fonte de interesse, aprendizado e bem-estar. O que mais podemos desejar para um pequeno artista?
Gabriel,
ResponderExcluirGostaria de parabeniza-lo pelo bolg com excelente conteudo. Cheguei ao encontro com a aplicação do Montessori à la maison (Montessori em casa) quando a minha filha era bebê e aos poucos fui entrando nesse universo maravilhoso de educar uma criança numa atmosfera respeitosa e que isso inlcui adequação do lar para o seu desenvolvimento. Quanto mais leio, mais vejo sentido nos ensinamentos e filosofia montessoriana e acredito que todo pai e toda mãe consciente deveriam entrar em contato com esse tipo de orientação.
Quanto às inclinações artisticas e musicais... Aqui em casa é normal haver musicas classicas bem baixinho, quase um pano de fundo. Eu e meu marido gostamos e ja percebo que a minha filha pede, às vezes para ouvir determinada musica e ver o clip (além dos cds, temos o canal de musica classica com os video clips). Meu marido toca violão e eu toquei piano durante alguns anos.
Quanto à pintura. A minha filha ira apresentar uma peça onde fala da Gioconda (Monalisa) e na sala de aula dela ha um quadro com a obra classica. Gostamos tanto da iniciativa da escola que resolvemos juntos aprender com ela. Imprimimos uma gravura de Monalisa e colocamos num quadro e ele fica na altura dela. E olha que interessante... Ela estava desenhando uma "menina" e ela veio me mostrar que, no seu desenho, a menina não estava com as mãos uma em cima da outra (como Monalisa) mas sim do lado do corpo... E por ai vai. Acho incrivel, fantastico poder acompanhar o seu desenvolvimento e estar ciente e consciente de que é o perido de grande absorção.
Abraços
Ana Paula,
ExcluirVocês têm uma filha de muita sorte! Para não falar na sorte dos pais...rs
Fico muito contente com o seu gosto por Montessori, e tenho certeza de que sua filha tirará bom proveito de cada estimulo que se lhe proporcionam!
Eu estou pensando em tentar organizar rodas de conversas com pais e mães, tanto em livrarias, lojas de brinquedos e casa de voluntários quanto via internet. Se você conhecer alguns pais que se interessem, podemos tentar organizar! É uma forma de expandir o número de pessoas que têm contato com essa metodologia tão interessante!
Abraço forte na família,
Gabriel
Gabriel
ResponderExcluirParabéns pelo blog. De forma clara e objetiva você mostra um roteiro para os pais. Angelina
Angelina,
ExcluirMuitíssimo obrigado! Enche-me de alegria um cometário assim vindo de você! Espero que os pais possam tirar bom proveito! Abraços!