LarMontessori.com

domingo, 16 de dezembro de 2012

NOVO ENDEREÇO

O Lar Montessori passou dois anos aqui, com esse layout gostoso e com amigos próximos e queridos. Mas a gente cresceu! E como crescemos, achamos melhor assumir um endereço mais simples e mais fácil de memorizar. De agora em diante, vocês vão encontrar o Lar em

www.LarMontessori.com



terça-feira, 11 de dezembro de 2012

Carta do Building the Pink Tower


   Alguns grupos no mundo estão trabalhando com força para espalhar o método Montessori para mais escolas e mais crianças. Um dos grupos com o trabalho mais belo é o Building the Pink Tower. Eles estão montando um documentário interessantíssimo e muito tocante sobre as Casas das Crianças - as salas de aula montessorianas para crianças de zero a seis anos.

   Depois de ver o belíssimo trailer no Facebook, entrei em contato com eles e pedi uma carta. Fiz um pedido especial: precisava ser uma carta que contasse a vocês a beleza da aplicação de Montessori em casa. Vina Kay, Co-Diretora do projeto, enviou-me a carta abaixo. O Lar Montessori apoia este projeto e insiste: apoie você também! Vamos construir o futuro da educação!

~

    Na primeira vez que entrei em uma sala Montessori, fui levada pela paz e pela beleza do ambiente, e pelo sussurro quase silencioso das crianças ocupadas com seu trabalho. Eu soube imediatamente que era isso o que eu desejava para meus filhos. Levando meu filho mais velho para a Casa das Crianças todos os dias, indo com meu filho menor para a sala dos bebês do outro lado do corredor, eu também absorvia o ambiente. A luz suave, as cadeiras pequenas, as bandejas cuidadosamente arrumadas com os materiais – era tudo belo para mim.

    O que percebo agora é que o ambiente vivido por meus filhos na escola era exatamente o mesmo que eu criava instintivamente em casa. Os dois se sustentavam e ajudavam-se mutuamente. O mundo pelo qual eu ansiava para meus filhos – calmo, respeitoso, gentil – era o mesmo mundo que eles viam na escola. Assim foi fácil continuar a experiência interagindo com eles em casa e estruturando nosso ambiente doméstico.

    Comecei a dar a eles pequenas tarefas que podiam executar: colocar a mesa, despejar água, limpar o espelho do banheiro. Juntos fizemos massa de biscoito e pão sovado. Essas atividades de nosso dia-a-dia eram valorizadas como trabalho importante no ambiente Montessori. Maria e eu estávamos nos ajudando!

    Havia obstáculos, claro. Quando eu perguntava a meu filho por que ele não guardava seus brinquedos em casa no final do dia do mesmo jeito que guardava seus trabalhos na escola, ele respondeu: “Na escola tem um lugar certo para tudo”. Depois de um momento de reflexão, eu vi o que precisava fazer para organizar nossos armários e prateleiras. Precisava ajudá-lo a ter um ambiente que facilitasse guardar as coisas.

    Hoje, meus filhos já são adolescentes, e ainda estamos tentando descobrir uma forma de guardar as coisas, mas todos nós crescemos e nos beneficiamos da educação Montessori. Agora, eu quero compartilhar a mensagem de que uma educação para criatividade, colaboração e paz pode ser acessível a todas as crianças. A criação um mundo mais pacifico, e não só os resultados da próxima avaliação, serão nossa forma de medir o sucesso da educação.


    Building the Pink Tower (Construindo a Torre Rosa) é um projeto de documentário que objetiva reimaginar a escolar e o aprendizado pelas lentes da educação Montessori. O título de nosso projeto parte do trabalho dos pequenos estudantes das Casas das Crianças que cuidadosa e metodicamente constroem algo belo com simples blocos cor-de-rosa. Sabemos que muita reflexão e planejamento foram necessários para apresentar às crianças esses blocos cor-de-rosa, e da mesma maneira, reconhecemos a vontade e o esforço necessários para abrir as portas a uma educação significativa.

    Acreditamos que um documentário que conte a história da educação e do aprendizado de forma bela, que leve os espectadores até salas de aula confortáveis e acolhedoras, que capture as vozes e expressões de crianças fazendo suas próprias descobertas, seja a melhor forma de mostrar ao mundo o potencial da educação Montessori. Nosso projeto levará algum tempo, e esperamos construir mais que um filme ou um debate: um movimento de paixões compartilhadas para tornar a educação significativa para as crianças. Acreditamos que a educação tem um futuro.

    Junte-se a nós neste movimento. Há muitas formas de ajudar. Precisamos de recursos para tornar este filme tão belo quanto a educação que desejamos para todas as crianças. Visite nosso website e faça uma doação. Assista ao nosso trailer e compartilhe com outros, boca-a-boca, por redes sociais e em reuniões. Curta nossa página no Facebook , siga-nos no Twitter, conheça-nos no Google+ e seja uma voz nesta conversa. Compartilhe nossa visão de educação.

 
Vina Kay
Co-Produtora/Co-Diretora
Building the Pink Tower




Os vídeos do Building the Pink Tower estão disponíveis no YouTube e no Vímeo, nos endereços abaixo:
Trailer no Vimeo: http://vimeo.com/39504864
Trailer no YouTube: http://www.youtube.com/watch?v=bveBrpqtAhY
Um olhar sobre uma sala Montessori: http://www.youtube.com/watch?v=S0HlI7dmOzU

segunda-feira, 3 de dezembro de 2012

Comemorações de Final de Ano - Decoração

E chegou dezembro! Com ele, chegam também as datas que, para alguns, são as mais especiais do ano. Hora de preparar a casa, convidar os amigos e conversar. Hora também de preparar pratos deliciosos e oferecê-los aos mais queridos. Hora de renovar a si mesmo para o ano que logo chega.

Tudo muito bem, e tudo muito bom. Mas como fica seu filho em toda esta comemoração? Embora, na tradição cristã, o Natal comemore o nascimento de uma criança e mesmo o Ano Novo seja a celebração do nascimento de um novo ano, aqueles que nasceram recentemente ficam um pouco deslocados enquanto os adultos cantam, comem, e conversam em altas vozes. Alguns dirão que as crianças são as que recebem mais presentes, mas em uma outra data especial, conversamos e chegamos à conclusão de que as crianças não gostam dos presentes em si, mas do aprendizado advindo da experiência que o presente pode proporcionar. Assim, se só nos preocupamos com o presente para a criança, a estamos formalmente excluindo da comemoração.

Nesta sequência, vamos dar uma olhada nas várias formas possíveis de integrar os pequenos nas datas tão especiais que estão chegando. Vamos passar por três pontos interessantes: primeiro, conversaremos um pouco sobre a decoração. As crianças podem e adoram ajudar a pendurar enfeites, grudar coisas, posicionar objetos. Depois, vamos abordar rapidamente a culinária - o que você e seu filho podem fazer juntos para a ceia. Finalmente, vamos pensar sobre como lidar com a noite de comemoração. Às vezes posso adotar, sem querer, uma perspectiva exclusivamente cristã, e por isso peço desculpas aos leitores de outras religiões. Eu vou realmente adorar saber se há comemorações e como elas são para os mais diversos credos. Por favor, dividam conosco nos comentários aquilo que vocês acharem mais interessante!

Primeiro, a decoração. Crianças pequenas gostam muito de coisas pequenas. Às vezes você observa seu filho caçando formigas, ou tentando pegar pequenos ciscos que ficaram na mesa - ou ainda pequenas sujeiras no chão? Isso é a demonstração clara de que, para elas, o que é muito pequeno chama a atenção. Esse fenômeno se dá por mais de uma razão. Os olhos dos pequenos ficam mais perto do chão e isso permite a eles a visão de coisas que nós, de uma distância maior, não vemos. Então, neste caso, não é que as coisas pequenas sejam mais interessantes, é só que eles veem as coisas pequenas e nós não. Em segundo lugar, no entanto, há uma maravilha nas pequenezas: aquilo é dominável. O que é grande não pode ser pego, ou explorado completamente, por alguém que é muito pequeno e ainda não sabe usar muito bem as mãos, as pernas e os olhos. Já o que é pequeno pode ser pego, carregado, experimentado.

Sendo assim, aproveite esse maravilhamento pelo pequeno e ofereça ao seu filho a possibilidade de ajudar a pendurar, por exemplo, os objetos na árvore de Natal. Ensine devagar, objetivamente, passo a passo, com clareza e exatidão como é que se faz: primeiro, abra o fio para pendurar o enfeite (ou segure o ganchinho), em seguida segure o galho, depois encaixe o pendurador aberto no galho e veja se ficou firme, então passe ao próximo enfeite. Dependendo da destreza de seu filho e do equilíbrio dele, a ajuda pode se estender a alguns galhos mais altos com o auxílio de um banquinho ou uma cadeira - até mesmo uma escada baixa - mas fique atenta(o), pode ser que ficar só nos galhos mais baixos seja suficiente ou mesmo que sua casa não precise de uma árvore tão grande assim e ele possa ajudar a decorá-la inteirinha.

Depois da árvore, peça ajuda para o presépio, ou qual sejam os objetos menores que fiquem espalhados por toda a casa. Aqui cabe um exercício que pode ser divertido. Se o seu filho já escreve ou gosta de tentar, ele pode fazer pequenas plaquinhas, em papel ou cartolina mesmo, para colocar em cada objeto. Assim ele cresce sabendo a diferença entre asno, boi, vaca, cordeiro, descobre o que é uma Estrela de Davi e até consegue nomear os personagens religiosos representados na sua comemoração com mais eficiência do que muitos adultos! Não é só uma questão religiosa, mas também um aprendizado cultural muito valioso, e ajuda a organizar montes de figuras novas na mente do seu filho.

Algumas famílias gostam de fazer calendários, eles são interessantes e podem ser belos. Sua função melhor é a de ajudar a criança a organizar o próprio tempo. Mas atente para a dificuldade da conta. Se você tem uma criança muito pequena em casa, procure fazer um calendário que conte de forma progressiva. Em vez de verem quantos dias faltam para o Natal e o Ano Novo, vejam mesmo em que dia estão, no mês, do primeiro de dezembro ao 25 ou 31. Contar progressivamente é mais fácil e mais útil para os primeiros anos de vida.

Com a ajuda das crianças sua casa vai ficar muito mais brilhante, mas mais que isso, os menores estarão realmente envolvidos nas comemorações e vão reconhecer a parte deles em tudo o que sua família e seus amigos disserem que está muito bonito. Vão perceber que conseguem fazer coisas bem feitas, mesmo na escala adulta e isso lhes dará confiança e uma sensação de posse sobre o sentido das datas muito mais aprofundada.

No próximo artigo, vamos conversar sobre como as crianças podem ajudar na cozinha e se tornarem chefs por um dia!

 

terça-feira, 27 de novembro de 2012

Compreendendo Montessori: Princípios da Infância

   O Lar Montessori tem muitos artigos sobre a adaptação da casa para a criança. Com a contribuição deste blog e de alguns outros grupos e famílias, a adaptação doméstica se torna cada vez mais uma tendência, e me enche de alegria enxergar a contribuição que damos a este movimento.

   Muitas vezes, porém, com a melhor das intenções, pais, tios, professores adaptam seus ambientes à criança acreditando que acabou aí e que o ambiente por si fará tudo o que Montessori descreve em sua extensa obra. Embora seja bem verdade que a interação livre entre criança e ambiente já seja capaz de muitos milagres, é claro que há mais que isso. É claro que há muito mais que isso.

   Uso o termo milagres um pouco com um tom leve de graça. Evidentemente, não se tratam de milagres, e é justamente sobre isso que escrevemos nesta série de artigos. Espero que sejam artigos breves, bastante objetivos e sucintos e, portanto, dando brecha a muitas dúvidas (sempre bem vindas). Trataremos de três pontos principais nesta sequência de publicações: 1. Princípios de compreensão da criança em Montessori; 2. Princípios de compreensão dos materiais e do ambiente montessorianos e 3. A preparação espiritual do adulto. Esses temas já foram tratados em maior e menor profundidade aqui. Mas acho que vale uma revisão!


   1. Princípios de compreensão da criança em Montessori:
   Montessori, por meio de longas observações do comportamento da criança durante os primeiros seis anos de vida, chegou a uma conclusão que sintetizou da seguinte maneira em seu Mente Absorvente: "Se a ajuda e a salvação podem vir, vir-nos-ão apenas da criança, pois que a criança é o construtor da homem". Montessori explicava que durante os primeiros anos de vida - inconscientemente de zero a três e conscientemente dos três aos seis - a criança absorve os estímulos de seu ambiente (conceito chamado de mente absorvente) e desta forma constrói o homem. A ideia da construção do homem foi e é compreendida de forma muito metafórica até hoje, como se fosse uma maneira poética de tratar o desenvolvimento da criança. Não é.

   Montessori, em última análise, era bastante literal e objetiva em tudo o que dizia. Com a expressão "construtora do homem" e com a "mente absorvente", Montessori adiantava, sem saber, ideias que seriam novamente exploradas, então pela Neurociência, mais de meio século depois. Norman Doidge, em seu polêmico e elucidador livro O Cérebro que Se Transforma, explica: "O que é extraordinário durante o período crítico do córtex [aparentemente os seis primeiros anos] é que ele é tão plástico que sua estrutura pode ser alterada pela exposição a novos estímulos" e "a diferença entre a plasticidade do período crítico e a plasticidade adulta é que no período crítico os mapas cerebrais podem ser alterados pela simples exposição ao mundo externo porque 'a maquinaria de aprendizado está continuamente ligada'".

   Outro conceito fundamental para a compreensão da infância em Montessori é a ideia de um guia interno. Ela desenvolveu a teoria de que existe, na criança, uma orientação inata para o aprendizado daquilo que é essencial para sua sobrevivência e melhor adaptação. Por isso, segundo ela, a criança consegue aprender a linguagem humana, mas não aprende linguagens animais. E embora Montessori só trate da linguagem oral e escrita, o mesmo se pode dizer tranquilamente das línguas de sinais. A crianças as aprende com a mesma facilidade que aprende as línguas orais e a mesma área do cérebro é utilizada para as duas coisas, na posição de língua materna/natural, embora não me venha agora o local em que li sobre isso.

   Doidge também explica isso (deixem-me dizer: está sendo meu segundo contato com as neurociências, então estou aprendendo mesmo. Não posso dizer muito sem citar). O autor nos diz:
"Durante o período crítico, o BDNF ativa o núcleo basal, a parte de nosso cérebro que nos permite concentrar a atenção - e que o mantém ativo por todo o período crítico. Uma vez ativado, o núcleo basal nos ajuda não só a prestar atenção, mas a lembrar de nossa experiência. Ele permite que a diferenciação e a mudança ocorram sem muito esforço. Segundo Merzenich: 'É como um professor no cérebro dizendo: 'Ora, isto é muito importante - é isto que você precisa saber para a prova da vida." Merzenich chama o núcleo basal e o sistema da atenção de "sistema modulatório da plasticidade" - o sistema neuroquímico que, quando ativado, coloca o cérebro num estado extremamente plástico".

   Montessori tratou também dos períodos sensíveis do desenvolvimento. Intervalos temporais durante os quais a criança se encontraria propensa ao desenvolvimento de uma determinada habilidade. Como disse o professor Daniel Willingham, da Universidade de Virgínia, "Montessori está muito além do que as ciências congnitivas sabem. Devagar estamos chegando lá". Nem todos os períodos sensíveis de Montessori já foram comprovados pelas ciências do cérebro. Mas aquele que é mais enfatizado pela autora foi, e aparece no mesmo livro que usamos de apoio até agora: "Esta sensibilidade permite que os bebês e as crianças pequenas captem sem esforço novos sons e palavras durante o período crítico do desenvolvimento da linguagem, simplesmente ouvindo os pais falarem".

   O que a neurociência chama de plasticidade extrema, Montessori chama de mente absorvente; o que hoje se entende como formação de conexões neurais, nossa médica chamava de construção do homem; aquilo que compreendemos como núcleo basal, ou BDNF, a educadora dizia ser o guia interno da criança e finalmente, aquilo que as ciências cognitivas chamam de período crítico, Montessori nomeava por período sensível. Desta forma, vemos quanto o professor Willingham fala sério quando cita Montessori e quanto esta era objetiva e verdadeira quando explicava que "A base da reforma educativa e social, necessária aos nossos dias, deve ser construída sobre o estudo científico do homem desconhecido", em A Formação do Homem.

   Eu sei que este texto foi denso e que ele foge ao nosso padrão aqui. Eu prometo evitar isso, mas é o que acontece quando tentamos comunicar aquilo que estamos descobrindo. Espero reflexões e, se por acaso algum dos nossos leitores for estudioso da área e quiser elucidar algo nos comentários, tudo é sempre bem vindo! Se você não é estudioso(a) de ciências cognitivas, mas é mãe ou pai e quer deixar suas impressões, é claro que todos nos alegraremos com isso também!

   O próximo artigo tratará de princípios de compreensão dos materiais e do ambiente montessorianos e deve demorar mais um pouquinho para sair. Provavelmente no meio tempo alguns mais tranquilos serão publicados!

   Até breve e um abraço!
   Gabriel

segunda-feira, 12 de novembro de 2012

O Quarto Montessoriano

Para compreender melhor este artigo visite o blog
"How we Montessori" clicando nas poucas
fotos que colocamos. São todas de lá, e são excelentes!

Em vários artigos deste blog o quarto montessoriano é mencionado, mas percebi há poucos dias que em nenhum dos textos eu o detalhei com cuidado. Como há alguns dias o iG Delas publicou uma reportagem sobre a não-necessidade do berço no quarto infantil e nos citou como uma das referências, achei uma boa ideia escrever, pela primeira vez, um texto em detalhes sobre o quarto da criança em Montessori.

O primeiro passo para a montagem de um quarto infantil é adotar o ponto de vista da criança. Aquilo que ela puder acessar deve ficar ao nível de suas mãos. Os brinquedos dela são dela, e podem ser deixados em prateleiras baixas o suficiente para que os alcance. O mesmo se pode dizer de suas roupas. Se queremos que a criança se vista sozinha um dia, e saiba escolher o que vestir, devemos deixar pelo menos algumas de suas peças disponíveis para o acesso.

O ponto de vista da criança não é só a altura de seus olhos ou o alcance de seus braços, mas o comprimento de suas pernas. Um quarto muito grande no qual haja brinquedos e materiais por todas as paredes é pouco prático, caro, dá trabalho para limpar e organizar e a criança não consegue de nenhuma forma controle total sobre seu ambiente.

Então, aqui, vamos abordar três grandes tópicos:
1. A Cama
2. A Mobília
3. Os Estímulos

A cama da criança pode ser mesmo uma cama. Não precisa ser um berço, e eu vou dizer isso de novo: não precisa ser um berço. Quando comecei a estudar Montessori em casa, me parecia radical demais tirar o berço. Mas só é assim porque culturalmente somos criados para pensar que ele é necessário. Em dezenas de outras culturas (que não a branca ocidental), as crianças dormem no chão, em colchões ou almofadas dos mais variados tipos, a depender do povo. O que nós defendemos, com uma abundância de evidências positivas bastante animadora, é que a criança pode, sem risco de saúde ou segurança, dormir em um colchão, que pode ser colocado direito sobre o chão ou sobre um estrado baixo, para isolá-la da temperatura do piso.

Quando o bebê é pequeno, muitos pais gostam de proteger este colchão com almofadas, em volta, para que a criança não corra o risco de cair durante a noite. É uma boa ideia. Mas nenhuma cerca é necessária. A criança não precisa ficar presa se o quarto for adequado a ela, basta que fique segura. Algumas almofadas ou travesseiros em volta da cama durante a noite dão conta do recado - Durante o dia, deixe sem proteção, para que seja fácil para seu filho subir e descer da cama quando desejar.

Ao lado do colchão, você pode deixar um tapete longo, para que a criança não pise direto no chão gelado quando acordar. Isso não é uma recomendação estritamente montessoriana, mas a tensão imediata dos pés de manhã cedo pode ser bem desconfortável e tensionar o corpo todo em seguida. Se o quarto for pequeno, ou se o piso for de madeira, isso é menos necessário.

Alguns pais gostam de dormir com seus filhos nos primeiros meses. Embora haja algumas defesas bastante interessantes deste processo, do ponto de vista montessoriano e do ponto de vista da segurança existem alguns pontos a considerar: dormir com os pais gera segurança psicológica para a criança, é claro. Mas esta segurança pode sumir assim que ela tiver de dormir em outro móvel ou outro ambiente. Uma das consequências deste tipo de ação é que a criança gera uma dependência bastante alta para dormir e só consegue pegar no sono se for ninada, ou se for acompanhada pelos pais até a própria cama. Um dos muitos objetivos de uma cama baixa é que a criança possa se deitar quando sentir sono, sem depender em nada dos pais para isso. A prática de dividir a cama pode atrapalhar neste processo.

Do ponto de vista da segurança, por sua vez, existe o risco de sufocamento da criança, além da inibição da movimentação noturna do bebê. Sabemos que pode ser muito agradável dividir a cama, para você e para seu filho, mas o movimento noturno é necessário, faz parte das liberdades da criança, e deve ser completamente possível. Quanto ao sufocamento, embora pessoalmente eu ache difícil que um pai ou uma mãe sufoquem o filho sem perceber, a página americana do Instituto Nacional da Saúde da Criança e do Desenvolvimento Humano indica que há vários estudos apontando para a maior incidência de morte de crianças em camas compartilhadas por diversas causas. Entre elas estão uma coberta que sem querer cubra o bebê, e pais muito cansados (provavelmente porque podem não perceber seus próprios movimentos e os da criança). Fora isso, a cama dos pais é alta, e tira a liberdade de a criança sair dela quando quiser, caso acorde mais cedo, por exemplo, sem depender dos pais para nada. Por sua vez, a página da Nestlé para mães (que não é fenomenal, mas tem pontos interessantes) explica que pediatras indicam o compartilhamento do quarto durante os primeiros meses, mas não o da cama. Além disso, notícias tristes como as do Mail Online e especialmente do The Guardian nos alertam para os riscos do compartilhamento da cama.

Gosto de reforçar com frequência que o Lar Montessori não se propõe a ser sua única fonte de informações para a criação de seus filhos - ao mesmo tempo temos a reconfortante certeza de que não o somos. As famílias que nos visitam também costumam visitar muitas outras páginas, e isso propicia uma incrível troca de informações. Nos diga o que você pensa sobre a cama, porque isso realmente nos interessa!

Uma ressalva que merece ser feita: para a criança recém nascida, dormir no chão pode envolver alguns problemas. Em livros sobre Montessori produzidos no hemisfério norte e em locais menos tropicais, insetos não são considerados. Mas aqui podemos pensar neles e considerar que para os primeiros meses pode ser uma boa ideia um berço. Ele, no entanto, tem de ir embora rápido, por todos os motivos que a gente já conhece. Você pode fazer do berço uma escrivaninha, quando a criança crescer um pouco!

A mobília do quarto infantil é simples. Não é necessário haver nada muito sofisticado, mesmo! As crianças gostam de ser, muito mais que de ter. Se pudermos proporcionar a elas a possibilidade de se tornarem seres humanos plenamente desenvolvidos, isso já as satisfaz. Assim, poucas coisas são realmente necessárias no quarto infantil: um espelho horizontal baixinho; estantes baixinhas; uma barra na parede; espaço livre e uma janela (não precisa ser da altura da criança, pode ficar tranquila!).

O espelho é interessante por diversos motivos. A criança pequena gosta muito do rosto humano. Por algum motivo biológico mesmo, é algo que lhe agrada. Assim, poder ver um rosto humano a qualquer momento sempre é bom. Fora isso, é importante para o bebê reconhecer seu próprio rosto, as possibilidades de movimento dele e as partes de seu corpo. Isso não se dá de forma consciente e nem é um processo imediato. Demora. Mas não temos pressa. O tempo da criança é interno a ela e nossa tarefa é só ajudar. Fora isso, enxergar-se pode ajudar a criança a se reconhecer como indivíduo, auxiliando no desenvolvimento da autonomia e da força de vontade. Por motivos de segurança, o espelho precisa ser muito bem preso e pode ser de acrílico.

As estantes baixas não precisam ser construídas à parte - embora possam, se você assim o desejar, e isso só será positivo. Você pode adaptar os armários que já existem, tirando suas portas, colocando puxadores mais para baixo ou simplesmente deixando as portas sempre abertas. Usar as gavetas de baixo, geralmente abandonadas, para colocar as roupas da criança também é uma boa ideia. Você não precisa nem deve colocar todos os brinquedos e todas as roupas à disposição do seu filho de uma só vez. No livro Montessori: The Science Behind the Genius, Lillard explica que até seis opções são uma boa ideia, porque aumenta a sensação de bem estar da criança. Mais que isso começa a ser demais e muito mais que isso fica realmente confuso. Você pode praticar uma rotação de objetos e deixar sempre presentes aqueles que a criança gosta mais e ir trocando aqueles que ela escolha com menos frequência.

A barra na parede tem uma utilidade só: ajudar a criança a andar, sem depender da ajuda direta dos pais. Pode-se pendurar objetos nesta barra, com espaços de intervalo, para que a criança tenha objetivos a atingir quando tentar caminhar. A utilização da barra precisa ser ensinada, claro, devagar, passo a passo, e quando você perceber que seu filho está tentando levantar e dar os primeiros passos. Se não houver espaço para uma barra, é possível usar um móvel bem fixo como ajuda para este desenvolvimento. Duas precauções devem ser tomadas neste caso: primeiro devemos nos assegurar de que o móvel é mesmo bem fixo, e depois ficar atentos para que a criança não utilize outros móveis pela casa e nas casas dos outros, para fazer a mesma coisa, o que pode ser bastante complicado às vezes.

O espaço livre aumenta se o quarto é feito seguindo algumas dessas dicas. Diminuem os móveis, e a dimensão dos que sobram é menor. Assim, a criança tem mais espaço para brincar, aprender, se mover e ser livre. A janela é importante para que haja luz natural no quarto, que faz sempre bem. Não tem problema se neste quarto não bate tanto sol, mas se houver luz natural, sabemos que é mais confortável para os olhos e boa para a pele.

Os estímulos de que a criança precisa são sensoriais. Os brinquedos e os materiais, assim como os livros, não precisam ser muitos e nem muito sofisticados. Madeira e metal são os melhores materiais para brinquedos, porque realmente estimulam os sentidos, muito mais que plásticos. 

Um dos materiais mais interessantes para a criança pequena é a Cesta dos Tesouros, que você pode ver clicando no link. Para bebês novinhos, móbiles são uma boa ideia também - feitos com formas geométricas e cores fortes (fortes, não brilhantes), porque os pequenos gostam muito de contrastes evidentes e tentar alcançar as peças do móbile é bom para o desenvolvimento motor. Como durante um tempo razoável os bebês não enxergam longe, os móbiles podem ficar próximos da criança, a até 40cm de altura a partir do colchão, por exemplo, ou menos. Há de se tomar cuidado, somente, para que não seja alcançado muito facilmente a ponto de a criança poder puxar o móbile para baixo, o que poderia machucá-la.

Os livros não precisam, necessariamente, ser materiais sensoriais. Eles podem ser só de leitura, e o exercício de abrir, ver figuras e virar páginas já será interessante para a criança. Especialmente se os pais lerem para a criança e para si mesmos (é muito, muito importante que os pais leiam como atividade de lazer, sozinhos, para estimular a leitura nas crianças). Ainda assim, há alguns livros muito interessantes que trazem texturas, tecidos e outros adendos interessantes. Isso é bom. Os livros que trazem sons, no entanto, em geral são bem ruins. O som é estridente e bem artificial.

Para o estímulo auditivo vale a pena ter instrumentos musicais e um rádio, no qual podem tocar, por períodos do dia, músicas de compositores clássicos, em geral adorados pelos pequenos. Os instrumentos podem ser uma flautinha doce simples e boa, um violão, ou mesmo um chocalho, nos primeiros tempos.

~

Pronto. Acho que conseguimos dar uma boa ideia de como é um quarto infantil montessoriano. Este é um dos temas mais discutidos no grupo do Facebook "Montessori para Mamães", no qual papais e educadores também são muito bem vindos e você pode encontrar boas informações nos seguintes links:

Vídeo de um lindo bebê em uma cama montessoriana:
Reportagem do iG Delas:
Blog Potencial Gestante:
Montessoriando - Quartos para recém nascidos (Fantásticas ilustrações):
Montessori & Família (blog do Montessori para Mamães):

Textos do Lar Montessori sobre temas relacionados:
Respeito pela Criança:
O Sono:
Manual da Criança Montessori:
Preparação do Ambiente da Criança:

quinta-feira, 8 de novembro de 2012

Círculo de Estudos em Montessori

   Há mais de um ano amigos e conhecidos comentam que seria muito legal ter um grupo com quem discutir Montessori. Fora isso, há uma ausência quase absoluta de Montessori nas universidades e faculdades de Pedagogia. Se você quer conhecer, discutir e estudar Montessori mais a fundo, venha conosco! Não é necessário nenhum conhecimento anterior de Educação, e o grupo é grátis!



   Para os amigos de outros estados, de Portugal ou das nações irmãs na África, adianto que os encontros serão registrados em vídeo ou texto, e aos poucos tornaremos isto interativo e disponível na internet.


sábado, 27 de outubro de 2012

Normalização II: O Equilíbrio Natural da Criança

"Para aqueles que compreendem a vida, isto
pareceria sem dúvida muito mais verdadeiro."
(Antoine de Saint-Exupéry em O Pequeno Príncipe)

   Para os admiradores de Montessori, especialmente no início de suas realizações, o processo de recuperação do equilíbrio natural da criança que acontecia nas Casas dei Bambini era comparado a um milagre e uma conversão religiosa. Os efeitos da liberdade em um ambiente preparado conseguidos pela pedagogia científica da médica italiana a levaram a ocupar longos artigos, diversas entrevistas e belas fotografias em jornais de todo o mundo. Ainda assim, no entanto, poucas pessoas compreenderam bem como Montessori o que realmente estava acontecendo: surgia, diante dos olhos de todo o mundo, o equilíbrio natural da criança. "Eu aponto para as crianças", Montessori dizia, "e as pessoas olham para meu dedo".

   As crianças para quem ela apontava eram especialmente silenciosas, gostavam muito de trabalhar com os materiais didáticos e eram extremamente organizadas. Falava-se, na sala, mas baixinho, e ria-se na sala, mas com mais frequência havia sorrisos. As crianças mais novas às vezes esqueciam de guardar o que haviam utilizado, mas as mais velhas sempre lembravam, e tudo isso mantinha o clima da sala atrativo para todos os visitantes. Montessori, no entanto, reafirmava: esta é a natureza da criança. Elas são assim. Em um ambiente preparado onde sejam deixadas em liberdade, elas são naturalmente assim. O processo pelo qual elas estão passando se chama normalização, e elas são crianças normalizadas.

   Devido a dezenas de traduções e mudanças de significado da palavra normal, a ideia de normalização é sempre mal compreendida e parece aos leitores e estudantes de Montessori, assim como aos pais, que se trata de algo que o professor faz com o aluno. Na verdade, é algo que a criança faz a si mesma. Por isso,  depois de uma extensa conversa com a Profª Edimara de Lima, diretora da PRIMA - Escola Montessori de São Paulo, que tive há vários meses e sobre a qual fiquei pensando desde então, decidi adotar, no Lar Montessori, o termo "Equilíbrio Natural da Criança" para tratar do que Montessori e seus contemporâneos chamavam de criança normalizada.

   E.M. Standing (autor de "Maria Montessori: Her Life and Work"), amigo pessoal de Montessori e grande estudioso de seu método, conseguiu estabelecer uma lista de características mais comuns às crianças naturalmente equilibradas. As marcas que ele encontrou foram as seguintes:

  •  Amor à ordem;

   A criança pequena precisa de um ambiente organizado. Nos primeiros meses ela não poderá organizar nada, então, quando desorganizar algo, procure restabelecer tudo. Isso realmente faz bem, agrada e tranquiliza a criança. Quando ela for mais velha, a partir dos dois ou três anos, é bom começar a ensinar a guardar as coisas. Colocar no lugar depois de usar. Para isso, mantenha tudo o que a criança usar em uma altura que ela possa alcançar. Como as crianças gostam de ordem, guardar as coisas será algo que farão com tranquilidade. Até os seis anos, pode ser necessário lembrá-las com bastante frequência, e ajudar umas três vezes ao dia. Aos poucos, a criança aprende a guardar o que usa, e faz isso com eficiência!
  •  Amor ao trabalho;
   Assim como o amor à ordem e todas as outras características, esta é inata. No entanto, no caso do amor ao trabalho, não precisamos incentivar a criança a trabalhar. Ela faz isso com o que quer que encontre em seu caminho, naturalmente. Nosso papel aqui é orientar este trabalho de forma que ele seja mais produtivo para a formação interna do ser em desenvolvimento. Ensinar as atividades passo-a-passo, devagar e objetivamente é uma maneira de engajar a criança em atividades interessantes e garantir que ela possa fazer as coisas sozinha da próxima vez. A outra forma, tão importante quanto, é dar atividades para as quais a criança esteja preparada - assim, garantimos a possibilidade de sucesso e, ao contrário do que pensamos, a criança aprende com o acerto, e não com o erro.

  •  Concentração espontânea;
   Quando a criança é muito pequena, é comum que mantenha os olhos em um ponto fixo. Mais tarde, a vemos tentando pegar coisas com muita força de vontade. Depois, em um ambiente preparado, a vemos se esforçando por montar peças, empilhar coisas, encaixar pedaços, decifrar enigmas. A concentração espontânea é, além de uma das características mais belas, uma das que mais devem ser respeitadas. A concentração só pode ser espontânea. Dizer "preste atenção" ou "pare de fazer o que está fazendo e venha comigo" são duas formas de interromper o fluxo de concentração, e não de inciá-lo. A atividade produtiva livre é a única forma de permitir que a criança desenvolva mais esta característica natural.

  •  Apreensão da realidade;
   Isso é o que a criança está tentando fazer desde o momento em que abriu os olhos ou os ouvidos para seu ambiente. Desde a primeira vez em que sentiu o ar entrar pelas narinas ou moveu os braços e os dedos, a criança tenta compreender e internalizar a realidade que a cerca. Nossa tarefa, como pais, mães e professores, é garantir que ela consiga fazer isso. Por meio de um ambiente preparado para ela, no qual ela possa olhar coisas bonitas e interessantes, pegar e sentir todo tipo de objetos e ouvir os sons do mundo, nós oferecemos para a criança todas as possibilidades de apreensão da realidade, para que ela use à sua maneira e no seu ritmo. Assim, permitimos que ela aprenda sozinha e obedeça sua tendência normal de desenvolvimento.

  •  Amor ao silêncio e ao trabalho solitário;
   Parece um pouco assustador, à primeira vista, que uma das características da criança seja querer ficar quieta e trabalhar sozinha durante alguns períodos, às vezes bem longos, de seu dia. Na verdade, no entanto, encontramos esta mesma característica naqueles que se esforçam pelo bem da humanidade: nos cientistas e nos monges. Desligar a televisão, falar baixo com o cônjuge ou irmãos mais velhos e não interromper seu filho são as melhores formas de garantir que ele possa continuar a formar um ser humano internamente. Procure não o forçar a trabalhar em grupo. Durante os primeiros seis anos isso pode ser chato. Trabalhar individualmente não o fará mais egoísta - ao contrário, o ajudará a se tornar um pequeno ser humano completo e que, portanto, poderá doar-se com mais vontade mais tarde.

  •  Sublimação do instinto de possessividade;
   É diferente gostar dos objetos e querer tê-los só para si. Admirar objetos, cuidar deles e querê-los em ordem e bom estado é natural da criança. Recusar-se a dividir, ou amar os objetos mais do que os trabalhos que se pode realizar com eles não são atitudes naturais nem comuns e em geral tratam-se de comportamentos incentivados por aqueles que circundam a criança. Objetos não devem ser queridos por si, mas pelo que permitem realizar - mesmo no caso de uma obra de arte, não deve ser ela o mais importante, mas a beleza e o aprendizado que transmite. Ajudamos a criança com isso quando não damos valor excessivo aos objetos e enfatizamos mais as vivências do que as posses no dia a dia. Criar plantas e animais, assim como dividir brinquedos com irmãos e amigos também ajuda.

  •  Poder de agir por escolha;
   A criança, quando nasce, age por princípios naturais de desenvolvimento e por tendências de comportamento inatas. Só com o tempo é que consegue desenvolver a capacidade de agir por escolha. O desenvolvimento desta habilidade é natural, e tende a acontecer mesmo sem nossa ajuda. Podemos ajudar, porém, com o jogo do silêncio e várias outras atividades das quais a criança goste e nas quais o objetivo principal seja conter um determinado tipo de comportamento. Somente aprendendo a conter um comportamento a criança (e mesmo o adulto) aprende a agir por escolha e não por vontade inconsciente. Estas atividades, no entanto, precisam ser feitas de forma agradável, mesmo divertida, e nunca violentando a liberdade da criança.

  •  Obediência;
   Parece contraditório defender a liberdade da criança e ao mesmo tempo explicar porque a obediência é natural. Mas não há nenhuma contradição. Primeiro, porque se é natural, faz parte de sua liberdade e, segundo, porque não falamos de uma obediência cega e despropositada. A obediência é um desenvolvimento importante a adorado pela criança porque ela percebe - embora inconscientemente - que é capaz de determinar seus atos e de agir em consonância mesmo com a vontade de outra pessoa, criando assim o princípio do sentimento de comunidade dentro de si, ao mesmo tempo que aumenta seu poder de agir por escolha. Não ajudamos a criança lhe dando todo tipo de ordens o tempo todo, isso nunca deve ser um hábito. Mas pedir favores de vez em quando, determinar rotinas e brincar de desafiar seu filho a fazer algumas coisas - como brincadeiras, jogos, e não ordens com desobediência sujeita a punições - podem ser excelentes maneiras de incentivá-lo a desenvolver suas capacidades.

  •  Independência e iniciativa;
   Se você segue o Lar Montessori há algum tempo, ou se vem criando seu filho com liberdade - conhecendo ou não os princípios montessorianos - sabe que independência e iniciativa são evidências de uma criança que vem se desenvolvendo com tranquilidade e respeito. Não há uma forma só de incentivar isso, mas tudo o que publicamos no Lar ajudará com essa parte. O ambiente preparado, a liberdade e o respeito são as melhores formas de permitir à criança desenvolver a liberdade e a iniciativa. Eles gostam de descobrir como fazer, e gostam muito de fazer. Tudo o que nos cabe é ajudar com tudo o que pudermos.

  •  Auto-disciplina espontânea;
   Porque a criança desenvolve as capacidades latentes e inatas de obediência, amor ao silêncio, ao trabalho, à ordem, ação por escolha, independência e iniciativa, é claro como água que o primeiro resultado é a auto-disciplina espontânea. Para ajudar nesta etapa do desenvolvimento, é muito bom que desenvolvamos uma rotina fácil, leve e repetida, que consigamos lidar bem com a autoridade e que haja liberdade e respeito ao tempo e às preferências da criança. São assuntos complexos, já abordados no Lar, mas que exigem mesmo um longo período de tentativas. Como a auto-disciplina é um dos dois maiores resultados da recuperação do equilíbrio natural da criança, ela depende de todo o resto para acontecer. Atente para o resto, e ela, como todas as características, surgirá naturalmente.

  •  Alegria.
   Chegamos ao final, nada surpreendente, da nossa lista. Este é o ponto culminante de um desenvolvimento saudável. A cultura ocidental por vezes nos faz achar que o sofrimento, a dor e o mal estar emocional e psicológico são necessários. Não são. A cultura oriental, com a qual Montessori conviveu durante dois dos mais importantes anos de sua vida, nos ensina que os acontecimentos são necessários, mas que sofrer ou não por eles depende da maturidade psicológico-emocional daqueles envolvidos nos acontecimentos. A alegria não vem da ausência de acontecimentos desagradáveis - eles existem. Vem, antes, da capacidade humana de agir por escolha, de conseguir sublimar o instinto de possessividade e de ser alegre, por causa e apesar de tudo.
   Por sorte, no entanto, acontecem mais coisas boas que coisas ruins, e na maior parte do tempo a criança não tem nenhum motivo para ficar triste ou para aprender a lidar com acontecimentos desagradáveis. Na maior parte do tempo, em liberdade e em um ambiente preparado, a criança tem tudo que seu corpo e sua psique pedem, tudo o que é necessário para desenvolver-se física, psicológica e emocionalmente e, por isso, é contente, sente-se satisfeita consigo e com o mundo e em geral sorri bastante. A alegria de uma criança que passou pelo processo de recuperar seu equilíbrio natural é radiante, mas nem por isso é escandalosa. Percebemos essa alegria na tranquilidade, no bem estar ameno e nas pequenas e suaves comemorações a cada desafio que consegue superar.

-

Será fantástico saber como estão sendo as coisas na sua casa e saber a sua opinião sobre o processo que comentamos aqui. O que você achou da mudança de nome que nós sugerimos? Quais dessas características são mais marcantes no seu filho? Como você lida com situações nas quais seu filho precisa ficar algum tempo em ambientes que não são preparados para ele? Quando falar das crianças, por favor, nos conte a idade delas, para sabermos sobre quem estamos conversando!
Um grande abraço!

quinta-feira, 11 de outubro de 2012

Dia das Crianças, não dos produtos

"Gosto muito do pôr do sol.
Venha, vamos ver um pôr do sol".
(Antoine de Saint Exupéry, em O Pequeno Príncipe)

   Hoje, quando estava almoçando, liguei a televisão no jornal da tarde. O âncora dizia, enquanto víamos imagens de lojas e ruas: "E a 25 de Março está vazia! Para quem quer comprar o presente de dia das crianças, ainda dá tempo!". 25 de Março é o principal centro de comércio a varejo em São Paulo, e é famosa por seus descontos fantásticos em produtos de qualidade baixa ou média.

   Na hora, veio-me à mente uma fala que havia lido no Facebook, dias antes: Neste 12 de outubro, faça com que o dia seja das crianças, e não dos produtos. Lembrei-me também do livro que já mencionei aqui em um artigo anterior: "The World Needs Your Kid" e do blog sobre miniamlismo da Jéssica, o Minimal Student.

   Crianças não ligam para brinquedos. Os pais que já conhecem e praticam Montessori há algum tempo sabem disso. Elas ligam para o prazer advindo do aprendizado que a experiência com o brinquedo proporciona. Então, não é o brinquedo que importa, são três outras coisas:
  1. o prazer
  2. o aprendizado
  3. a experiência
   Como o prazer certamente advirá do aprendizado e o aprendizado só pode surgir a partir da experiência, vamos pensar em experiências. Sabemos que a criança pequena gosta de usar os sentidos e adora ter trabalho. No dia das crianças, podemos proporcionar isso a ela de várias maneiras.

   Uma ideia é organizar um passeio em família para um parque, praça, ou oficina infantil. Em um parque, a criança pode explorar todo o entorno natural que lhe faz tão bem. Pode aprender as texturas das folhas, troncos, da grama e da terra. Ela pode sentir o cheiro das flores, pode ver (e pegar!) insetos, lagartas, minhocas... Cuidado com aranhas, taturanas e animais com ferrão, mas de resto, toda experiência sensorial é científica!

   Passear pelo parque pode proporcionar para ela a oportunidade de conhecer plantas diferentes, e lembre-se de que crianças adoram categorizar. Separar as coisas em flores, arbustos, árvores e ervas-daninha pode ser um jeito de ajudar seu filho a organizar o mundo. Além disso, claro, vale comer uns sanduíches feitos em casa com suco, água, leite ou chá e brincar de roda-roda, pular corda, esconde-esconde, pega-pega, rolar na grama e todas as outras brincadeiras que você e seu filho conhecem bem!

   A praça é um passeio menor, mas muitas vezes é tão bom quanto o parque. Aqui em São Paulo sei que há várias praças com parques de diversão e outras de beleza natural que vale a pena. Conheço uma chamada Praça do Por do Sol, que fica em um local bem alto da cidade e que permite ver o por do sol de um ponto de vista fantástico. Além disso, tem muita grama, árvores, espaços amplos para brincadeiras e conversas. Ir a uma praça pode ser mais fácil para uma família em que todo mundo trabalhe ou para uma criança que não goste de ficar muito tempo no carro, até chegar em um parque que fique longe.

   As oficinas infantis acontecem em várias cidades do Brasil durante o dia 12 de outubro e o fim de semana que o segue. Nem todas são legais. Algumas funcionam com base em competições, outras têm como tema personagens de desenho animado. Mas há um punhado que oferece oportunidades incríveis para as crianças: utilizar materiais recicláveis, superar obstáculos físicos como montanhas de almofadas ou ladeiras de borracha, conviver com crianças de outras classes sociais. Passar um dia em uma oficina assim pode ser muito, muito mais divertido do que ganhar um carrinho, uma bola ou um quebra-cabeça.

   Em alguns casos, porém, pode estar chovendo, pode estar trânsito, e um passeio pode ser bem complicado. Aí vale a pena dar o presente? Não. Não, por dois motivos: primeiro, as coisas são mais caras no dia das crianças, não compensa. E em segundo lugar, seu filho não pode associar seu afeto com objetos, com presentes. Seu afeto tem de estar nas suas palavras, nos abraços, no carinho que você pode e deve oferecer todos os dias.

   Se não houver nenhum passeio para fazer, não tem problema. Faça uma atividade sensorial, faça um pão e peça ajuda para fazer a massa, faça uma salada de frutas e precise de ajuda para cortar as frutas, uma faxina de mentira com ajuda para varrer um pedaço da sala ou do quintal. Se estiver frio, faça tudo de dentro de casa, e se estiver quente, plante uma flor no quintal, use a varanda para montar um brinquedo com tecido ou papel (e o principal não é o brinquedo, mas montar o brinquedo).

   Se você faz parte de uma família que aprecia uma boa educação social, também há vários locais que propiciam o contato entre diversas classes sociais, organizações que dão espaço para algumas crianças darem brinquedos para outras, e você pode ensinar sua criança a dar, sem esperar nada em troca.

   Finalmente, o que importa é fazer deste dia um Dia das Crianças, no qual seus pequenos sejam prioridades completas, em primeiro, segundo e terceiro plano. Dia 12 de outubro não é dia de dar presentes para seu filho, mas é dia de despertar o prazer advindo do aprendizado que surge a partir da experiência.

   Um abraço e feliz Dia das Crianças!

   

domingo, 30 de setembro de 2012

Minimalismo e Montessori

Há alguns dias publiquei no Diário Minimalista um pequeno texto sobre minimalismo e Montessori. Agradou a alguns leitores que chegaram lá por interesse em Montessori, e agradou a outros que chegaram por interesse em minimalismo. Pelo resultado com os leitores montessorianos, achei que seria uma boa ideia colocar o texto aqui também! Espero que lhes seja interessante!

--


   Eu já disse em um post anterior que meu maior foco de estudo e trabalho é o Método Montessori. Quando comecei a ler sobre minimalismo, pensei: puxa, se existisse um método de ensino minimalista ia ser incrível! Já pensou? O professor só falar o suficiente, não atrapalhar o raciocínio dos alunos com muitas palavras, levar todas as imagens necessárias, mas sem uma overdose de ilustrações que possa confundir. Uma sala com um mínimo de carteiras, grandes e bonitas, e com muito espaço livre, num ambiente agradável aos olhos, leve e em que tudo fosse útil... Seria incrível, não?

   No parágrafo acima, eu acabei de descrever o método Montessori. Em Montessori, o professor fala muito pouco, e somente o necessário. Todas as palavras que ele pronuncia são úteis e detalhes não saem de sua boca, pois percebemos que detalhes confundem. Poucas e boas palavras realmente ensinam. Existem muitos materiais, muitos mesmo, mais de uma centena. Mas todos são belos, de cores suaves e, mais importante, todos ensinam.

Sala da escola montessoriana Tip-Toe
   A sala montessoriana é grande sempre. Mas há poucas mesas e muito chão livre. Neste chão os alunos estendem tapetes e trabalham com os materiais em quase silêncio e com todo o tempo que precisarem. Não há figuras de desenhos animados ou quadrinhos nas paredes, e em vez delas encontramos belíssimas reproduções de quadros importantes da nossa cultura colocados com um bom espaço entre um e outro, para que os olhos da criança não fiquem nunca cansados.

   Há amplas janelas em qualquer ambiente montessoriano. Deve haver muita luz, muito ar fresco. As crianças em um ambiente assim são deixadas em liberdade e por isso são tranquilas, alegres, sorriem bastante, sabem conversar, são muito educadas e até aprendem a ler mais cedo!

Quarto montessoriano
   Engana-se, no entanto, quem acha que tudo isso é feito para que as crianças aprendam mais e mais cedo. Não. É justamente porque elas gostam de aprender deste jeito que nós montamos a sala desta forma e nos comportamos assim. Elas nos mostram como aprendem melhor, e nós modificamos a sala e o comportamento para satisfazer a natureza delas. Elas agem, nós observamos. Elas falam, nós escutamos. Elas trabalham (bom, nós também, e muito, mas principalmente) nós organizamos o ambiente de trabalho delas.

   Talvez por ter sido educado em uma escola Montessori e ter feito deste método o foco da minha vida, eu tenha achado tão simples e agradável o estilo de vida minimalista. Eu já conhecia o método de ensino minimalista, só não sabia que o nome dele começava justamente com m.

quarta-feira, 26 de setembro de 2012

Normalização I: O Respeito pela Criança

Este texto faz parte de uma série de dois artigos sobre normalização. Este é sobre o respeito à criança. O próximo será sobre a normalização em si, que já foi chamada de milagre da educação e conversão natural da criança, ambas denominações errôneas para um processo que nada mais é além da recuperação, por parte da criança, de tendências que lhe são naturais. Seja bem vindo, e antes de ler este texto, leia o Manual da Criança Montessori, disponível aqui no Lar!

   "Montessori segue os caminhos da Natureza", disse E.M. Standing, explicando o ponto de apoio mais importante de todo o método Montessori. Temos sempre de lembrar que a Natureza sabe o que faz, e que os maiores milagres só podem ser operados pela natureza sendo deixada em liberdade para agir dentro e fora da criança. A natureza aprisionada perde sua magia - vemos isso claramente nos pássaros que nascem livres e são engaiolados, nos peixes capturados do mar, nas meninas e meninos que são colocados, contra a vontade, em clausuras e mosteiros.

Nasce daí uma obediência que pode ser interpretada como virtude, mas também nasce daí a diminuição da vontade de viver, e os seres vivos aprisionados deixam de emanar aquela energia que é tão bela de se ver numa criança livre, em um pássaro em liberdade ou em uma mata virgem: a Natureza livre não recebe esta liberdade de ninguém, ela nasce assim e só com esta liberdade mantida é que pode operar as maiores maravilhas do mundo.

A criança nasce livre. Se nós a mantivermos livre, ela, como todos os outros seres da natureza, agirá conforme sua capacidade e exigirá do mundo conforme sua necessidade. Se for deixada em liberdade, não irá querer mais do que precisa, não irá rejeitar o pouco de que precisa, irá se comportar como seu ambiente natural permite: com amor ao silêncio, amor ao esforço-aprendizado e amor à ordem interna e externa. Estas são as direções inatas da criança que Montessori percebeu por suas observações e que Standing tão sabiamente sumarizou em seu "Maria Montessori: Her Life and Work".

Qualquer pai, mãe, irmão ou professor percebe algumas coisas em crianças muito pequenas: elas gostam de silêncio ou sons bastante suaves, mas o barulho incomoda muito, quase machucando. Gente falando muito alto com elas também é ruim, assim como pessoas muito bem intencionadas que falam com "voz de bebê", ou pessoas ainda melhor intencionadas que lhes presenteiam com DVDs de programas de televisão, desenhos animados ou programas educativos. Elas gostam de silêncio, músicas baixas, suaves e tranquilas, sons da natureza e a voz humana em volume e quantidade moderada.

Todos nós também sabemos que crianças são curiosas. É por isso que não deixamos medicamentos ao alcance de crianças, que tomamos cuidado com brinquedos com peças pequenas que podem ser engolidas, que procuramos esconder todas as tomadas, colocar uma portinha na escada, ficar sempre de olho quando o fogo está aceso, e também é por isso que perdemos a calma com seus "por quês?", "comos?" e "quandos?". Evitamos que coloquem coisas na boca e que coloquem a mão em animais perigosos ou peçonhentos.

Por último, sabemos intuitivamente que as crianças amam a ordem, embora nem sempre respeitemos isso. Sabemos que gostam de roupas claras e suaves, que seus quartos lhes agradam mais quando tem poucas coisas, que elas não precisam de muitos brinquedos, de muitos objetos ou de muitos materiais, que lhes basta muito pouco para se sentirem realmente bem e que tudo de que necessitam é que esse pouco seja muito bem escolhido, muito limpo e muito bem organizado. Nada precisa ser muito, ser grande ou ser caro, basta que seja muito bem cuidado e organizadinho.

   Acontece, porém, que como não respeitamos sempre essas necessidades da criança, acabamos por reprimir (e eu não gosto muito dessa palavra, mas é isso) a natureza dela e forçamo-la a adotar posturas artificiais diante do mundo. É por isso que crianças que nasceram amando o silêncio acabam gostando de programas de televisão e desenhos animados irrealistas e violentos, é por isso que os pequenos bebês curiosos aos poucos se tornam cansados e apáticos diante do mundo e crescem como alunos que perguntam se "vai cair na prova" em vez de perguntar "Por quê?" e é também por isso que aquelas criancinhas que adoravam tudo no seu lugar acabam por largar tudo no meio do caminho e por jogar tudo no chão em sinal de protesto.

O respeito à natureza da criança vem de duas formas bastante simples, na verdade, e que englobam todas as outras formas menores: respeito pelo espaço e pelo tempo.

   O respeito pelo espaço da criança é manifestado pela escolha sábia daquilo que será útil. Não é útil comprar dez brinquedos antes de a criança nascer. Nem é útil que ela tenha vários brinquedos de um mesmo tipo ou qualquer coisa assim. Este tipo de presente alimenta uma forma nada natural de vontade de possuir.

É útil dar à criança aquilo que suas atividades ou manifestações pedem. Quando ela começa a querer ouvir sons mais de perto ou a provocar sons com o corpo e com o que está em volta, é interessante lhe dar pequenos instrumentos, chocalhos, o violão da família, ou mesmo permitir que batuque em potes, móveis da casa e lhe oferecer músicas clássicas, instrumentais e sons da natureza. Da mesma forma podemos estimular todos os outros sentidos.

Outro ponto muito importante para o respeito ao espaço é organizar a casa. Casas com crianças precisam ser casas arrumadas. Eu sei que é difícil, mas é assim que tem que ser. É da sua capacidade de organizar o caos que advirá a capacidade da criança de manter tudo organizado. A ordem lhe agrada, e agrada muito, mas ela só sabe que gosta de ver tudo organizado, não nasce sabendo organizar. Então, precisamos guardar as coisas que ela desarruma durante alguns anos, depois, aos poucos, podemos ensiná-la a guardar também. Tu-do or-ga-ni-za-di-nho!

Para tudo ficar em ordem e essa ordem poder ser percebida, não pode haver muita coisa. Um quarto de criança montessoriano é um quarto clean, minimalista (aprendi a palavra esses dias e adorei), quase vazio. Tem o necessário, e o necessário sempre é pouco.

O último ponto muito importante de respeito ao espaço da criança é que a casa inteira deve ser o ambiente dela (menos a cozinha, porque no começo é um ambiente perigoso demais. Aos poucos esse pode ser explorando junto com você e aos dois anos o acesso já pode ser livre). Não deve haver um quarto completamente adaptado ao seu tamanho e todos os outros com coisas grandes e inalcançáveis. Se você não conseguiu adaptar a casa toda ainda, feche as portas ou coloque grades nos ambientes não adaptados, assim você lembra que precisa adaptar o mais rápido possível e ela não se frustra por ser mais baixa que todo o resto do mundo.


   O respeito pelo tempo da criança é ainda mais simples: basta compreender que o ritmo dela é completamente diferente do seu. Algumas coisas, para você, são rotineiras e desimportantes. Para ela, nada é um hábito. Ela acabou de chegar no mundo, ainda não sabe como as coisas funcionam. Fechar o zíper é uma experiência sensorial, amarrar o tênis é um desafio motor, subir em uma escadinha é uma aventura cheia de suspense.

Dizer para ela ir mais rápido não adianta, porque não faz o menor sentido. Ela não entende porque alguma coisa é mais importante do que aquilo que ela está fazendo no momento. E na verdade ela está certa, nada é mais importante. Ela está construindo um ser humano lá dentro dela. Está desenvolvendo as habilidades necessárias para a manutenção da civilização. Ela é responsável pelo trabalho mais nobre do mundo e deve ser respeitada e admirada por isso. Hierarquicamente, a criança sempre estará acima de nós, porque é ela que nos cria.

Precisamos organizar o nosso tempo para que possamos respeitar o tempo dela. Se sabemos que demora demais para comer, precisamos começar a almoçar mais cedo. Se demora muito para se vestir, teremos de marcar o passeio para mais tarde. Ela vai demorar bastante para muita coisa, quase sempre, e vai querer repetir tudo de que gostar. A repetição é fundamental e agradável para ela. Permita.

Respeitar o tempo não significa desistir da rotina. Veja o texto sobre rotina e ritual para entender melhor esse assunto, mas saiba desde já: estabelecer um horário para dormir é bom, mas isso não deve ser forçado demais. A criança pode indicar devagar qual a hora mais apropriada para seu sono, ou você pode induzir devagar um horário necessário para a família. A mesma coisa para comer. Pode haver horários para as refeições, mas eles precisam respeitar o apetite dos pequenos. 

  Tenho certeza de que fazendo tudo isso você estará respeitando a natureza da criança que vive com você. E uma natureza respeitada leva inevitavelmente a uma vida mais prazerosa, mais cheia de energia, de sorrisos, de alegrias e de contentamento. Haverá episódios de manha, de rebeldia. Analise essas situações, tente entender porque elas aconteceram. Não se vingue com broncas fortes demais ou palmadas. Entre vocês dois, você tem de ser o ser humano que sabe mais e o mais maduro. Ela está aprendendo, e está criando, lá nas profundezas de sua natureza, um próximo ser humano, sábio e maduro também.